A Prova Pericial, Sua Relevância e Utilização pelos Tribunais

I – Introdução:

A generalidade dos processos judiciais têm início com a denominada “petição inicial”, onde o autor identifica as partes, expõe os fundamentos da sua pretensão e formula o pedido.

Segue-se a denominada “contestação” e, eventualmente, a “réplica”, onde os demandados (seja o réu ou o autor) deduzem os fundamentos da sua defesa.

Porém, não basta alegar os factos. As partes devem indicar as provas. Serão estas que irão, ou não, convencer o Juiz da realidade dos factos alegados.

Do elenco das provas admissíveis em direito, uma das mais relevantes é a “prova pericial”.

 

II – A prova pericial – Noção:

A prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devem ser objecto de inspecção judicial.

 

III – Sua relevância:

Os Advogados e os Magistrados (juízes e procuradores) são licenciados em Direito. Presume-se, por isso, que dominam este ramo da ciência. Porém, não raras vezes, as questões que se suscitam nos Tribunais demandam conhecimentos especiais que, nem os Advogados, nem os Magistrados possuem.

Alguns exemplos:

  • Cumprimento das regras da arte na execução de contratos de empreitada;
  • Avaliação de móveis, imóveis, servidões e outros direitos reiais;
  • Avaliação psicológica de arguidos para determinação de (in)imputabilidade;
  • Análise à contabilidade de sociedades comerciais;
  • Avaliação de danos corporais, lesões permanentes e graus de incapacidade em acidentes de viação e acidentes de trabalho;
  • Avaliação da (in)capacidade de determinada pessoa em reger a sua pessoa e os seus bens;
  • Avaliação de danos patrimoniais;
  • Exame de reconhecimento de letras e assinatura;

Nestes casos, pode ser muito difícil (até impossível) demonstrar a realidade dos factos alegados sem o recurso à prova pericial, daí a sua relevância.

IV – Regime da perícia em processo civil:

A perícia pode ser singular ou colegial.

Será colegial quando o Juiz o determine ou alguma parte o requeira. Neste caso, será designado um colégio de três peritos: o perito do Tribunal, o perito do autor e o perito do réu.

Porém, a perícia será sempre singular nas acções com valor até €15.000,00 e nos demais casos em que a Lei o determine.

A parte que requer a perícia, deve logo indicar o seu objecto (formulando as questões que pretende ver colocadas ao perito). A parte contrária pode aderir à perícia ou propor a sua ampliação ou restrição.

Seguidamente, o Juiz fixa o objecto da perícia e nomeia o(s) perito(s).

Os peritos prestam compromisso de cumprimento consciencioso da função que lhes é cometida, realizam os actos de inspecção que julguem indispensáveis e apresentam o respectivo relatório pericial. Mesmo nos casos em que a perícia é colegial, será apresentando um único relatório.

Se as partes entenderem que o relatório enferma de deficiência, obscuridade ou contradição, podem formular reclamações (no fundo, pedir esclarecimentos). Se não concordarem com as conclusões, podem fundamentadamente requerer a realização de segunda perícia.

Os peritos que intervieram na primeira perícia, não podem intervir na segunda.

 

V – Valor da prova pericial:

A força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo Tribunal.

Porém, o juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador. Por isso, sempre que não acolha as conclusões da perícia, o Juiz deve fundamentar esse afastamento, exigindo-se um acrescido dever de fundamentação.

A prática vem demonstrando que, salvo muito raras excepções, os Tribunais tendem a acolher os juízes técnicos dos peritos.

 

VI – Conclusão e comentário:

A prova pericial vem sendo considerada um meio de prova muito fiável. Por isso, em todos os processos judiciais, é cada vez maior o risco de o Perito se tornar Juiz. E sendo cada vez mais comum o recurso à prova perícia, este “fenómeno” tem o condão de subverter totalmente o sistema da justiça.

Por isso, é nossa convicção que a perícia não deve substituir a audição das pessoas e nem as inspecções judiciais. Deverá ser mais um meio de prova, mas não o único.

Concomitantemente, é fundamental que se restrinja o objecto da perícia apenas aos factos que carecem dos mencionados conhecimentos técnicos que o julgador não domine, não admitindo quanto aos demais.

Por fim, é elementar que todos os operadores judiciários, incluindo os Advogados e Magistrados, nunca percam o sentido crítico indispensáveis à justa composição do litígio e, no fundo, à realização da justiça.

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