O Acórdão de (Des) Uniformização da Jurisprudência

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2022

O Futuro do Investimento em Produtos Bancários com risco associado

Foi publicado, em Diário da República, no dia 3 de Novembro de 2022, o acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 8/2022.

O referido Acórdão debruçou-se sobre um litígio protagonizado por dois subscritores de obrigações subordinadas que pediam a condenação de um Banco ao pagamento do capital e juros vencidos, visto aquele, na qualidade de intermediário financeiro, ter garantido o respectivo cumprimento.

Em face do mesmo, entendeu o Pleno das Secções Cíveis uniformizar jurisprudência.

De todos os pressupostos da responsabilidade civil, o nexo de causalidade é talvez o mais controverso e aquele que mais desafios apresenta actualmente, principalmente quando nos deparamos com áreas específicas do Direito que, pelas particularidades que oferecem, exijam um esforço adicional do intérprete-aplicador em adaptar o instituto da responsabilidade civil à complexa realidade que lhes subjaz, como é o caso da intermediação financeira.

O referido acórdão veio revelar precisamente algumas destas dificuldades.

Conclui o acórdão que, estando em causa a violação dos deveres de informação de um intermediário financeiro (facto ilícito e culposo), “incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a tomar a decisão de investir”. Trata-se de uma prova apreciavelmente difícil, pois exige-se ao lesado que este prove um facto negativo.

Admite a fundamentação de direito do acórdão que “o que o regime do CVM pode trazer de diverso é a diminuição da exigência do regime da prova do nexo de causalidade no sentido de se dever facilitar ao investidor a demonstração da sua ocorrência, por forma a não se inverter a lógica do sistema de responsabilidade civil, pois é de reconhecer que é difícil ao investidor demonstrar, sem sombra de dúvidas, que nunca realizaria o investimento efetuado se a informação em falta lhe tivesse sido prestada, mas tal facilitação não se traduzirá numa inversão do ónus da prova, nem da adesão à doutrina do “comportamento conforme à informação”, que tem sido propugnada por alguns autores e já subscrita por algumas decisões dos tribunais.

Contudo, o acórdão acaba por não concretizar como deva tal “facilitação” ocorrer na prática, de maneira que acaba por não divergir daquele que tem sido o entendimento tradicional sobre o tema.

Dentre as 12 declarações de voto, que permitem concluir que o tema permanece polémico, destacamos a do Conselheiro Nuno Manuel Pinto de Oliveira: “Estando em concreto presentes todos os elementos potencialmente relevantes para a prova da condicionalidade, o acórdão concluiu que a presença de todos os elementos relevantes era insuficiente […] o investidor confrontar-se-á sempre com um obstáculo, e o obstáculo é intransponível – exige-se-lhe que faça uma prova que o investidor não pode fazer; exige-se-lhe que faça a prova de que tomaria uma decisão que não tomou, e de que tomaria uma decisão que não tomou se tivesse uma informação que não teve! […] Entre os limites à autonomia dos Estados-membros na transposição das directivas está o princípio da efectividade – e, de acordo com o princípio da efectividade, a prova da relação de condicionalidade entre a violação do dever e o dano do investidor não deve ser nem impossível, nem (tão-pouco) demasiado difícil […]”.

 

O presente documento possui informação prestada de forma geral e abstrata, não devendo servir de base para qualquer tomada de decisão sem assistência profissional qualificada e dirigida ao caso concreto. Caso deseje obter esclarecimentos adicionais sobre este tema contacte a CCM Advogados (geral@ccmadvogados).

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