A Tecnologia e o Direito

A tecnologia está a revolucionar o mundo em todas as suas vertentes. O Direito e a Justiça não são excepção, sendo que, actualmente, a tecnologia é parte integrante e indispensável da prática jurídica. As vantagens são inúmeras, mas também os riscos, designadamente, o de substituição dos Advogados e Magistrados, em algumas tarefas da justiça (um dos pilares da democracia), por inteligências artificiais.

Na prática jurídica, a tecnologia é já uma realidade incontornável:

1-) Nos registos de aquisição de propriedade, de constituição de propriedade horizontal, de constituição de usufruto, de direito de superfície e de servidões, entre outros, que actualmente são promovidos por via electrónica. O mesmo sucedendo com o registo de hipotecas, penhoras, arrestos, contratos promessa com eficácia real, reservas de propriedade, entre outros;

2-) Na protecção das criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, incluindo a protecção dos direitos dos respectivos autores (direitos de autor e direitos conexos), também promovida por via electrónica;

4-) Na protecção da propriedade industrial, tecnologia e invenções, de criações estéticas (design), sinais distintivos que permitam identificar e distinguir produtos e empresas no mercado (marcas), através do registo de patentes, modelos de utilidade, ou marcas, também promovidas por via electrónica;

5-) Na comunicação dos contratos de arrendamento à autoridade tributária e aduaneira, actualmente também promovidos por via electrónica;

6-) Na prova em processos judiciais, onde destacamos a prova em matéria de direitos reais, cada vez mais baseada em perícias, levantamentos topográficos, cartografia, fotografias aéreas (e respectivo histórico), entre outros meios de prova de origem tecnológica, em detrimento da prova testemunhal (cada vez mais considerada equívoca);

7-) Na realização de transcrições de despachos, de depoimentos gravados, etc., que podem actualmente ser feitas por “software” ou “inteligência artificial”, que converte a voz em palavras escritas (garantida que esteja a qualidade da gravação e a utilização de linguagem clara);

Ao nível da “inteligência artificial”, existem actualmente dois projectos em desenvolvimento:

Uma ferramenta destinada aos Magistrados, desenvolvida pela Watson IBM, para permite pesquisas rápidas. A base do Citius é considerada insuficiente para as necessidades dos juízes e, para suprir esta lacuna, Portugal está a utilizar uma ferramenta da Watson IBM, essecialmente na área da pesquisa, permitindo rapidamente chegar a jurisprudência, conhecer interconexões entre acórdãos ou processos, entre outros dados.

Outra ferramenta destinada ao cadastro do território. Funciona em 10 municípios mas com o objectivo de alargar a todo o país, tendo surgido na sequência dos incêndios do Pinhal Interior, em 2017, e da necessidade de conhecer as matrizes das propriedades para ter um cadastro actualizado.

Trata-se de um algoritmo que trabalha com dados diversos, desde a topografia, a descrição predial, os marcos, a informação dos PDM e de associações florestais, REN, INE e Estradas de Portugal. Consegue verificar o sítio onde a matriz está localizada e identifica o proprietário. Além dos oito municípios do Pinhal Interior, Caminha e Alfândega da Fé também participaram e vai ser estendido a todo o país.

Funciona através do Balcão Único do Prédio (BUPi) um balcão físico e virtual, da responsabilidade do Instituto dos Registos e do Notariado que agrega a informação.

Existem também planos a nível do registo de patentes e da propriedade industrial, possibilitando que o sistema aceda a várias fontes e verifique a conformidade da patente a registar.

Na prática da advocacia, é indesmentível que a profissão está já mudar. A inteligência artificial pode já ser utilizada para analisar milhares de documentos em minutos, pesquisá-los por palavras-chave, organizá-los e categorizá-los por área, entre outras finalidades.

Porém, convém não olvidar que existem elevados riscos associados, já que os erros que venham a ser cometidos pelas “máquinas” que os advogados usem serão sempre da responsabilidade destes e podem não compensar a celeridade adquirida pelo automatismo. Da mesma forma que em segundos é possível resolver um número gigantesco de tarefas, em segundos é também possível cometer-se um número gigantesco de erros.

Por isso, a tenologia deve ser colocada ao serviço da prática jurídica, como meio de auxiliar os Advogados, os Magistrados, os Oficiais de Justiça e outros profissional forenses, na realização de tarefas fastidiosas ou repetitivas, de modo que aqueles se possam concentrar no seu processo criativo e nunca como forma de os substituir nessa tarefa.

De outra forma, seria fácil pré-determinar as decisões judiciais ou amordaçar a realização da justiça, mediante a sua subordinação a códigos ou algoritmos pré-definidos por programadores que pouco ou nada sabem de Direito ou dos problemas concretos das cidadãos.