Vistoria ao local arrendado pelo senhorio: como funciona?
Na locação de imóveis, o senhorio assegura ao inquilino, como contrapartida do pagamento da renda, o gozo da coisa arrendada. Esta obrigação do senhorio compreende, por um lado, o dever de abstenção de perturbar a utilização que o inquilino faz do locado e, por outro lado, o dever de executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato.
Pelo revés, são obrigações do inquilino, entre outras, não aplicar o imóvel para fim diverso daquele a que ele se destina e não fazer dele uma utilização improcedente.
Para o senhorio, a vistoria ou exame do imóvel tanto pode corresponder a um direito, quando pretende mostrá-lo a potenciais interessados na sua compra e/ou a futuros arrendatários, ou quando pretenda assegurar-se de que o inquilino o está a utilizar de forma prudente e de acordo com o seu fim, como a uma obrigação, quando deve verificar as obras ou reparações de que imóvel careça.
Já para o arrendatário, facultar o exame do imóvel ao senhorio é uma obrigação, desde que o senhorio exerça o direito com moderação e de acordo com os ditames da boa-fé, na prossecução de interesses legítimos.
A matéria assume relevância, uma vez que a violação pelo inquilino do dever de facultar ao senhorio o exame do imóvel pode conduzir à resolução do contrato de arrendamento.
Porém, o direito de o senhorio examinar o imóvel arrendado não é cego e nem irrestrito, pois pode ser usado como um meio para, na prática, prejudicar o gozo do imóvel pelo inquilino, sobretudo no arrendamento para habitação (onde o direito à reserva da vida privada assume grande importância). Ou seja, o senhorio não pode utilizar este direito para incomodar ou inquilino ou intrometer-se na sua vida, para o pressionar, perturbar ou criar um ambiente hostil, de intimidação, humilhante ou ofensivo, que possa ser até considerada uma situação de assédio.
Uma das questões que mais vezes surge é a de saber se o inquilino é obrigado a aceitar visitas de potenciais interessados em novo arrendamento ou compra do imóvel arrendado.
E a questão até pode ser levada mais longe, quando o senhorio decida examinar o imóvel para tirar fotografias do seu interior a fim de as utilizar na promoção de novo arrendamento ou venda do arrendado.
A Lei não define, de forma clara e precisa, as situações e o modo como o direito de exame do imóvel arrendado deve ser exercido pelo senhorio. Apenas estabelecer que, o arrendatário deve mostrar o local a quem o pretenda tomar de arrendamento durante os 3 meses anteriores à desocupação do contrato, em horário acordado com o senhorio ou, na falta de acordo, nos dias úteis, das 17h30 às 19h30 e, aos sábados e domingos, das 15h00 às 19h00.
Nos restantes casos, no silêncio do contrato, a questão será casuisticamente apreciada.
Por isso, de antemão e na fase de redigir o contrato de arrendamento, é importante convencionar regras, definindo as situações em que o inquilino é obrigado a tolerar o exame da coisa, o modo como deve ser comunicado e as condições em que deve ser exercido o direito, mormente estipulando os períodos temporais, horários, número máximo de visitas mensais, antecedência mínima de aviso prévio, entre outras.
No silêncio do contrato, o senhorio que pretenda examinar o imóvel deve comunicar ao inquilino, por carta registada com aviso de recepção e com antecedência razoável, a sua intenção de examinar o imóvel, justificando o seu interesse legítimo (que deve ser actual e concreto) e indicando dia e hora para o efeito, preferencialmente seguindo o critério temporal que o legislador considerou oportuno para a situação supra referida (nos dias úteis, das 17h30 às 19h30 e, aos sábados e domingos, das 15h00 às 19h00).
O conceito de “antecedência razoável” não é definido pelo legislador, tendo de ser encontrado casuisticamente, em função da finalidade do exame e da urgência, sendo sempre de privilegiar a fixação da data e hora por acordo entre senhorio e inquilino.
Se o inquilino não autorizar o exame, o Senhorio não pode simplesmente impor ou forçar a sua realização, ou ainda aproveitar a ausência do inquilino para se introduzir no imóvel sem autorização. Mas pode, caso considere a recusa ilegítima, resolver o contrato e interpor acção judicial de despejo com esse fundamento, quando tal incumprimento, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível a manutenção do arrendamento.

Associado da CCM Advogados