A proteção penal do consumidor
A lei define o consumidor como a pessoa que compra para proveito próprio, ou seja, que adquire algum bem ou serviço a um profissional simplesmente para uso ou proveito pessoal – artigo 2º da Lei nº 24/96, de 31 de Julho, denominada Lei de Defesa do Consumidor.
Desta forma, o particular que compra um automóvel para utilização lúdica, considera-se consumidor. Porém, se o automóvel for adquirido para o uso na sua profissão, o adquirente já não é consumidor.
A qualificação de uma pessoa como consumidor coloca-o sob um regime especial de proteção, pelo que é recorrente ouvirmos alusões, em diversas circunstâncias, aos “direitos do consumidor”.
A proteção do consumidor e a atribuição de direitos específicos dependem da existência de uma relação de consumo, que se estabelece com a aquisição de um bem ou serviço para uso não profissional.
Os seus direitos encontram-se consagrados na Constituição da República Portuguesa (CRP). O artigo 60º da CRP elenca os direitos indisponíveis e essenciais na defesa dos interesses do consumidor. Já o artigo 81º, alínea i) da nossa Lei Fundamental atribui ao Estado a obrigação de legislar e criar instrumentos para tutelar os seus interesses e assegurar a defesa dos seus direitos. Nesse âmbito, foi criada a Lei da Defesa do Consumidor, que estabelece o regime jurídico aplicável à defesa dos consumidores e elenca um conjunto de direitos que merece a tutela penal, além de informar quais os mecanismos eficazes para resolver conflitos com os fornecedores de bens ou serviços.
Desta forma, a proteção penal do consumidor assenta na ideia de que o Estado deve intervir para garantir a justiça nas relações de consumo que são marcadas por uma assimetria de poder, na qual o consumidor se encontra, normalmente, numa posição de desvantagem em relação ao operador económico.
Práticas comerciais desleais, publicidade enganosa ou responsabilidade na venda de produtos com defeitos: como pode o consumidor proteger-se perante estas práticas e como estão garantidos os seus direitos na Lei?
Apesar de não possuir caráter sancionatório, a Lei de Defesa do Consumidor estabelece os direitos gerais dos consumidores que merecem tutela relativamente aos bens/serviços que adquire:
i) Qualidade de bens e serviços: a lei exige que sejam cumpridas as expectativas legítimas associadas aos produtos, de acordo com as informações previamente prestadas;
ii) Proteção da saúde e da segurança: os produtos e/ou serviços adquiridos, em situação normal de uso, não podem implicar riscos incompatíveis com a sua utilização;
iii) Proteção dos interesses económicos: deve imperar a lealdade e boa fé na relação jurídica de consumo e existe proteção contra práticas comerciais desleais, abusivas ou fraudulentas, cláusulas contratuais abusivas (que restrinjam direitos) e também contra publicidade enganosa;
iv) Reparação de eventuais prejuízos: Em caso de danos causados por produtos ou serviços defeituosos, os consumidores têm o direito de serem indemnizados, podendo exigir a reparação, substituição, redução do preço ou resolução do contrato, dependendo da gravidade do defeito.
Para fazer valer esses direitos, existem disposições de ordem penal que visam punir práticas lesivas e fraudulentas que possam afetar a segurança, saúde ou até os interesses económicos dos consumidores. Em Portugal, esta proteção é garantida por diversas normas no Código Penal e legislação especial, abrangendo desde a comercialização de produtos defeituosos até a fraude em contratos de consumo.
Em suma, a proteção penal do consumidor é uma componente essencial do sistema jurídico em Portugal, que visa prevenir e, se for o caso, punir condutas abusivas ou fraudulentas com vista a garantir a confiança nas relações de consumo.
Contudo, a sua eficácia depende da articulação entre legislação, fiscalização e, sobretudo, educação dos consumidores, que devem ter a noção dos seus direitos de forma a impedir práticas lesivas desses direitos penal e constitucionalmente garantidos.
