A comunicabilidade de dívidas na execução

O processo de execução visa a cobrança coerciva de uma dívida e coloca em litígio duas partes distintas: de um lado, a pessoa que figura no título como credor e move a ação e em situação oposta a pessoa que figura no título como devedor – artigo 53º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC).

Não obstante, a lei processual civil admite uma exceção à regra geral da legitimidade consagrada no referido preceito, no que que diz respeito a dívidas contraídas apenas por um dos cônjuges. Tal concretiza-se com a dedução do incidente declarativo de comunicabilidade: este permite que o exequente (credor) ou o executado (devedor) possam chamar à execução alguém que não consta do título executivo como devedor, que passa a assumir também a posição de executado uma vez que a dívida é considerada comum ou comunicável.

Deste modo, a execução prossegue também contra o cônjuge do executado, por força do casamento celebrado entre ambos. Assim, a comunicabilidade da dívida no processo de execução refere-se à possibilidade de uma dívida contraída por um dos cônjuges ser considerada comum, ou seja, poder ser executada não apenas sobre o património do cônjuge que contraiu a dívida, mas também sobre o património comum do casal e, em certos casos, sobre o património próprio do outro cônjuge.

O princípio geral nesta matéria, de acordo com o disposto no artigo 1690º, nº 1 do Código Civil (CC), é o de que qualquer dos cônjuges tem legitimidade para contrair dívidas sem o consentimento do outro. O artigo 1961º do CC elenca as situações em que as dívidas são da responsabilidade de ambos os cônjuges:

– Dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do matrimónio, pelos dois cônjuges ou por um deles com o consentimento do outro;

– Dívidas contraídas para ocorrer aos encargos normais da vida familiar ( relativas a renda de casa de morada de família, alimentação, educação, saúde);

– Dívidas contraídas para proveito comum do casal (por exemplo, dívida contraída na aquisição de um automóvel);

– Dívidas resultantes da atividade empresarial de um dos cônjuges, exceto se vigorar entre os cônjuges o regime da separação de bens ou se ficar demonstrado que não houve proveito comum do casal.

Além do exposto, importa esclarecer que a comunicabilidade da dívida no processo de execução só pode ser invocada se a ação tiver sido movida apenas contra o cônjuge devedor e se o título executivo que esteve na base da execução for extrajudicial, ou seja, a ação executiva não pode resultar de uma decisão judicial (título executivo diverso de sentença). 

No litígio executivo, o incidente de comunicabilidade da dívida pode ser suscitado pelo exequente no seu requerimento executivo ou até ao início das diligências de venda ou adjudicação (que ocorrem após a fase de penhora de bens) – artigo 741º do CPC. Também o executado pode alegar, na sua oposição à penhora, que a dívida é comum e ao mesmo tempo especificar quais os bens comuns que respondem pela mesma e que devem ser penhorados – artigo 742º do CPC.

A parte que alegar a comunicabilidade da dívida deve sempre fundamentar, ou seja, apresentar todos os factos e comprovar que a dívida é comum ou comunicável. Em todo o caso, caberá sempre ao juiz decidir, perante os fundamentos apresentados, se a dívida é ou não comum.

Que efeitos pode ter se operar a comunicabilidade da dívida? Na prática, a execução passa a correr também contra o cônjuge não executado e nela podem responder os bens próprios do cônjuge não devedor, ou seja, podem subsidiariamente ser penhorados bens próprios daquele para satisfazer a dívida.

Em suma, qualquer dos cônjuges tem legitimidade para contrair dívidas sem o consentimento do outro, independentemente do regime de bens de casamento. Porém, por força do casamento celebrado entre ambos, a dívida pode afetar também o cônjuge não devedor caso seja suscitada e opere a comunicabilidade da dívida no processo de execução. 

Trata-se de uma necessidade de determinar as dívidas da responsabilidade do casal, com a extensão da legitimidade passiva na ação executiva ao cônjuge não devedor.

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